sábado, 26 de abril de 2008

Só peço a Deus

E o segundo, semelhante a este, é: Amarás ao teu próximo como a ti mesmo. Mateus 22:39





Não existe nenhuma dúvida de que o propósito da nossa existência é o de glorificar a Deus, aqui e na eternidade. Não é à toa é que um dos motes da reforma é Soli Deo Gloria (Rm 11.33-36; 1Co 10.31). Por isso mesmo que o primeiro grande mandamento é o de amar a Deus sobre todas as coisas, citado na lei e depois relembrado por Jesus Cristo (Dt 6.4-6).

O que não significa que o segundo grande mandamento seja opcional. Senão deixaria de ser mandamento. Infelizmente muitos crentes acham que atender 50% das ordens divinas é suficiente, ainda mais quando a outra metade representa se envolver com essa gentinha humilde, sem graça e pecadora. São os eternos discípulos dos fariseus e, assim como esses se escandalizavam ao presenciar Jesus se misturando com o povão, nossos modernos fariseus também se escandalizam quando vêem um pastor ou um presbítero envolvidos em questões comezinhas desse mundo, ao lado daquilo que julgam ser a escória. Amar ao próximo como a si mesmo deve ser uma tortura para essa casta de narcisistas.

Um discípulo maduro é um seguidor de Jesus Cristo comprometido com o cumprimento das ordenanças não se omite em relação ao que acontece com os seus semelhantes, sejam eles crentes ou não. A preocupação social faz parte do nosso mandado social que, junto com o mandado cultural (que nos coloca como mordomos da criação) deveria representar a nossa preocupação constante com tudo que nos cerca.

Sob a falsa alegação de ceticismo ou de que "esse mundo está perdido mesmo", temos nos tornado insensíveis à dor, à fome, à injustiça, às guerras, à traição e ao futuro - dos outros é claro, porque quando mexem conosco, ou com semelhantes da nossa classe social, ficamos revoltados.

Já não nos escandalizamos mais com a fome provocada pelas guerras étnicas - aliás, nem com as guerras. Toleramos a injustiça e a traição nas novelas e na vida política, como se isso fosse normal. Das novelas chego a ouvir com freqüência que os melhores personagens são os maus. A dor dos oprimidos não nos incomoda e acreditamos que, já que o mundo vai acabar mesmo, porque se preocupar com aquecimento global ?

Quem ocupa esse espaço de preocupação social, onde deveríamos ser líderes e não seguidores acabam sendo outras pessoas. Léon Gieco é um deles. Gieco é um músico argentino, um Bob Dylan meridional, que compôs um hino - sim, a meu ver um belíssimo hino - onde pede a Deus que a vida não lhe deixe cético e nem deixe que se conforme com as atrocidades que se cometem contra os demais seres humanos.

Me lembra alguns cânticos da minha mocidade que caíram no esquecimento. Saudades de letras do Gióia Júnior (Vem Jesus Salvador e Um só corpo), do Rev João Dias de Araújo (Que estou fazendo?) e do Guilherme Kerr (Barnabé). Acho que os jovens de hoje estão mais preocupados com a competição globalizada onde um precisa passar por cima do outro do que com aquilo que acontece fora dos seus círculos.

Enquanto isso , quem sabe alguém não traduz a música do Gieco e saímos cantando por aí ?

Sólo le pido a Dios
León Gieco

Sólo le pido a Dios
que el dolor no me sea indiferente,
que la reseca muerte no me encuentre
vacío y solo sin haber hecho lo suficiente.

Sólo le pido a Dios
que lo injusto no me sea indiferente,
que no me abofeteen la otra mejilla
después que una garra me arañó esta suerte.

Sólo le pido a Dios
que la guerra no me sea indiferente,
es un monstruo grande y pisa fuerte
toda la pobre inocencia de la gente.

Sólo le pido a Dios
que el engaño no me sea indiferente
si un traidor puede más que unos cuantos,
que esos cuantos no lo olviden fácilmente.

Sólo le pido a Dios
que el futuro no me sea indiferente,
desahuciado está el que tiene que marchar
a vivir una cultura diferente.

quinta-feira, 24 de abril de 2008

Santos 24 horas

“O mesmo Deus da paz vos santifique em tudo; e o vosso espírito, alma e corpo sejam conservados íntegros e irrepreensíveis na vida do nosso Senhor Jesus Cristo.” ( I Ts 5:23)

Eu tenho um problema sério com esses feriados de dia disso, dia daquilo. Acredito que limitar certas preocupações em relação a comportamentos ou pessoas é o mesmo que limitar esses mesmo comportamentos ou pessoas. Acredito que não exista nada mais machista que o dia internacional da mulher, nem nada mais racista que a semana da raça negra ; faz supor que os demais dias são dos homens e as demais semanas são das outras raças.

O mesmo ocorre na chamada “semana santa”. Se considerarmos santo com o seu sentido de separação , supomos que as demais semanas podem ser profanas. Se considerarmos o sentido de santificação pessoal vamos supor que, no restante do ano, podemos ter uma vida desregrada e afastada de Deus. Essa é a crença da cultura católica romana que permite todo e qualquer pecado nos dias que antecedem a quaresma (o carnaval) e festas profanas no dia seguinte à chamada sexta-feira santa.

Santificação, diferentemente do que muitos crêem, não significa bondade ética ou moral. Muitas pessoas são boa ética ou moralmente sem que, com isso, tenham um vida santificada. Santificação supõe uma vida com relação íntima com Deus, onde o Espírito Santo opera purificando os pecados e habilitando a pessoa para boas obras. Uma vida em que o velho homem (pecador) morreu e o novo homem (salvo) . Santificação não é um momento, mas um processo que dura toda a vida terrena e só se completa no nosso encontro com Deus.

Logo, a pessoa que não foi salva pode ser boa durante a semana santa e imoral em outros momentos. Pode ser pecadora todo o ano e se abster de pecar durante uma semana. Para o verdadeiramente crente isso é impossível. Deus não nos libera do processo de santificação para cairmos na “gandaia” de vez em quando. O Espírito Santo não tira férias para que a sua ação seja interrompida de vez em quando.

Se você é daquelas pessoas que acredita que essa semana é diferente das demais, que é mais “santa” ou mais “solene” que as outras, está na hora de você fazer uma revisão da sua vida com Deus e descobrir que pessoas realmente transformadas estão se santificando em todos os momentos das suas vidas.

segunda-feira, 21 de abril de 2008

Vá pentear macacos


"Quanto ao mais, ninguém me moleste; porque eu trago no corpo as marcas de Jesus". Gálatas 6:17

Paulo já era um senhor de idade e cheio de responsabilidades quando escreve aos Gálatas.

A carta, diferente de todas as outras do apóstolo, já começa com uma bronca, sem passar pelo tradicional elogio que costumava fazer à cada igreja. A carta toda é um libelo contra aqueles que queriam relativizar o sacrifício de Cristo, algo como : "foi bom Cristo ter morrido...mas além disso a salvação ainda precisa de X, Y ou Z".

Claro que ele já estava cansado dessas picuinhas auto-suficientes e, ao encerrar a carta (e no trecho que ele ressalta que escreve de próprio punho), retoma o tom reprovador e avisa que não para o aborrecerem mais com essas besteiras que ele tem mais o que fazer. Não quer ser incomodado com os desvios da verdade.

Igrejas e indivíduos briguentos esquecem sempre que, além disso ser uma conduta reprovável, ainda estão tirando a atenção daquilo que realmente é importante. Jesus Cristo já tinha advertido os crentes a esse respeito quando conta a parábola da figueira estéril : se, depois de tanto tempo, não dava frutos, só lhe restava ser cortada.

Quando leio e ouço tanta gente inventando novas formas de salvação e, invariavelmente, baseadas em méritos humanos, como se algum de nós tivesse um mínimo de capacidade de sair da lama onde nos metemos, tenho vontade de usar uma frase semelhante do meu pai : "ora, vá pentear macacos" e não me aborreça.

Para esses, Cristo é apenas um detalhe do plano de salvação que inventaram. O sangue derramado significa muito pouco comparado ao poder que eles mesmos se atribuem. A respeito desse poder já fomos alertados - muitos aparecerão fazendo sinais alegando que o fazem em nome d´Ele.

Nós não trazemos no corpo as mesmas marcas que Paulo. Esse foi apedrejado, espancado, chicoteado. Passou dias e noites em calabouços. Mas trazemos a marca da Graça que Deus nos concedeu por sua soberana vontade, nos redimiu pelo sangue de Cristo - suficiente para nos salvar e, pelo Espírito do Santo nos selou.

Vamos cuidar do que é importante ou seremos apenas mais um figueira cortada.

quinta-feira, 17 de abril de 2008

Menos iguais do que os outros

"Para que sejamos também como todas as nações ; " ( I Sm 8:20a)

Cada dia que passa ouço mais gente dentro da Igreja propondo que nos adaptemos à vida como ela é no mundo. Sugerem que nós precisamos nos adaptar às transformações que a sociedade está passando, que precisamos atuar de forma contextualizada, que precisamos ser mais tolerantes em relação ao pecado. Triste é perceber que, ao mesmo tempo que toleramos o pecado, somos mais intolerantes aos pecadores, quando deveria ser exatamente o contrário : amar as pessoas e detestar as práticas pecaminosas.

Cada dia que passa vemos mais igrejas sendo invadidas pelo mundo. Igrejas que aceitam os chamados "casamentos abertos" (seja lá o que isto signifique). Grupos musicais autodenominados "gospel" tocando músicas originárias de cultos satânicos (será que conhecem a origem do termo ou os grandes músicos do gospel music como os Blind Boys of Alabama, Johnny Cash, Aretha Franklin Aaron Neville e Take 6, dentre tantos outros?). Talvez não seja tão surpreendente considerando algumas que fazem festinhas de Halloween (dia das bruxas) para que as crianças não se sintam deslocadas dos coleguinhas de escola.

Igrejas que aceitam, defendem, e até "abençoam" práticas que a Bíblia define como abomináveis. Alguns se defendem com a expressão paulina de "fiz-me fraco entre os fracos para conquistar os fracos", ou seja, na hora que interessa descontextualizam a Bíblia para se contextualizar ao mundo. Seria mais honesto se dissessem que se fizeram fracos para poder cair na gandaia sem culpas. Paulo, em que pesem suas idiossincrasias, aproveitou circunstâncias mas nunca abriu mão da verdade.

No tempo dos juizes em Israel, o povo também queria se contextualizar. E por isso mesmo pediram um rei a Samuel, para que pudessem ser como todos os outros povos. O povo de Israel não percebia quem era o seu verdadeiro Rei. Não percebia que eram nação santa, povo escolhido de Deus para atuar como sacerdote entre os outros povos. Não entendiam que eram e precisavam continuar sendo diferentes .

Quando procuramos nos adaptar ao mundo estamos agindo da mesma forma que este judeus. Estamos abrindo mão de sermos raça eleita, propriedade exclusiva de Deus para sermos mais um entre muitos. Abandonamos a nossa missão de sermos sal da terra e luz do mundo. Tornamo-nos insípidos e não servimos para nada mais além de sermos lançados fora a e pisados pelos homens - o que tem corrido com frequência, diga-se de passagem.

Precisamos a cada dia lembrarmos que devemos ser, em oposição à expressão de George Orwell, menos iguais do que os outros , Totalmente diferentes. Precisamos nos adaptar cada vez menos e não nos conformarmos com este mundo para que possamos, como instrumentos de Deus , resistir à invasão e, como Igreja, levar a mensagem que transforma vidas.

segunda-feira, 14 de abril de 2008

Santa ironia


Para o Sérgio Mastromauro que me provocou a esse estudo e para o Luiz Rodrigo que, pela Graça, descobriu que Deus é um sujeito engraçado.

Então a ira de Davi se acendeu em grande maneira contra aquele homem; e disse a Natã: Vive o Senhor, que digno de morte é o homem que fez isso. Pela cordeira restituirá o quádruplo, porque fez tal coisa, e não teve compaixão. Então disse Natã a Davi: Esse homem és tu! (II Samuel 12:5-7)

Ironia é um termo que se origina de eirônetâ (grego)/irônia (latim) => êirên = falar. Uma forma de falar. Mas não é uma forma de falar qualquer, a ironia implica em fingir ignorância, dissimular e, principalmente falar algo que signifique exatamente o oposto do que as palavras levem a crer. Quando usa da ironia uma pessoa não está mentindo, ainda que aqueles que não entendem a frase possam ficar com essa impressão.

Desde a antiguidade a ironia é usada como método didático e motivador. Socrátes usava-a de forma a obter o melhor do raciocínio do seu interlocutor. Muitos a usam como motivação pedagógica, no estilo “duvido que você consiga” (mas espero que você consiga).Ela pode ser utilizada, entre outras formas, com o objetivo de denunciar, de criticar ou de censurar algo. Para tal, o locutor descreve a realidade com termos aparentemente valorizantes, mas com a finalidade de desvalorizar. A ironia convida o leitor ou o ouvinte, a ser ativo durante a leitura, para refletir sobre o tema e escolher uma determinada posição.

Uma frase irônica só pode ser entendida se rejeitarmos o seu sentido aparente. Esse é o ponto em que muitos se perdem. Ninguém começa uma frase avisando que será irônica, logo, para entender essa contradição é necessário estar com a percepção em alerta, e sempre exercitar a abstração. Uma vez compreendida, o conflito (tensão) entre os sentidos aparente e real provocam choque ou risada. É um discurso ligado à ambiguidade e ao humor.

Deus é uma pessoa bem humorada. E entender o humor de Deus não significa diminuí-lo ou desrespeitá-lo. Basta um bom passeio bíblico para vermos quantas vezes Deus usou da ironia, desde os nossos primeiros pais. Ou alguém acha que Deus não sabia onde estavam Adão e Eva quando pergunta "Onde estás?" (Gn 3:8-9). Ou quando pergunta a Caim onde estava Abel (Gn 4:9). Tudo bem que nenhuma das situações era engraçada, mas Deus desafiou as pessoas a atomar uma posição. Depois manda Noé construir um gigantesco navio no meio do deserto. Tira Abraão de sua terra sem dizer para onde o levava e, alguns anos depois pede que esse homem sacrifique o filho que simbolizava a aliança.

Deus também usa de ironia para escolher os seus enviados. Coloca seu projeto de aliança nas mãos de um enganador como Jacó. Manda Moisés, que era gago, falar com Faraó. Saúda Gideão como homem valente (quando ele estava escondido, morrendo de medo dos midianitas). Escolhe o menor dos filhos de Jessé para lutar contra o gigante. O aparente absurdo dessas escolhas tinha um objetivo, que era o de mostrar quem realmente agia. Deus já escolhia os loucos desse mundo.A parábola que Natã, em nome do Senhor, conta a Davi, é a fina flor da ironia do Antigo Testamento.

Por que relutamos tanto em aceitar o humor de Deus ? Será que só podemos acreditar num Deus carrancudo ? Ele mesmo revela o seu riso nos Salmos, depois dê uma olhada em Sl 2:4-5; 37:12-13; 59:7-9. Você vai redarguir, mas esse é um riso destruidor. Concordo, mas como ficam as ironias didáticas dos Provérbios a respeito da preguiça (Pv 6:9-10; 19:24; 26:14), do dinheiro (Pv 17:16) e das mulheres (Pv 11:22; 21:9 e 27:15) ? E a ironia transmitida pelos profetas ? Isáias mostra a ridícula humilhação das "peruas" da sua época (Is 3:16-23) também mostra quão absurda é a idolatria e, mesmo assim praticada pelos judeus (Is 44:9-20). A pergunta que Oséias faz ao povo que pedira um rei é terrível e irônica(Os 13:10 se referindo a I Sm 8).

Jesus Cristo foi o Mestre dos mestres também na arte da ironia. Seja com as suas parábolas (amigo importuno, juiz iníquo, dez virgens, dos primeiros lugares), seja com as suas perguntas retóricas. Alguém esconderia a luz ? (Mt Mt 5: 14-15). Em Mateus 7 existe uma série de perguntas irônicas. A própria pessoa de Jesus Cristo e sua dupla natureza permitem uma série de jogos de palavras entre espírito e carne (Jo 2;19-20 ; 3:4 ; 4:11; 7:34 ; 12:15 ; 16:16-18). Como o Pai, o Filho também usa de ironia para repreender (Jo 6:26 ; 13:27) e para desafiar verdade escondidas (Jo 18:4,7 ; Lc 24:17).

E a Bíblia continua com as ironias de Deus. Pedro é liberto da prisão mas fica preso para fora da casa (a cena chega a ser hilária) em At 12:13-16. Deus chega mesmo a usar de um espírito maligno para castigar um bando de charlatões que diziam falar em Seu nome (At 19:13-16). Paulo é outro que tanto usa a ironia como recurso didático (Rm 3:29 ; 6:1,15; 7:7,13) como reconhece a ironia de Deus escolhendo a escória do mundo no lugar dos sábios (I Co 4:10; 1:26-29) e o escravo como modelo cristão para o seu senhor (Filemon é a obra prima da ironia no Novo Testamento).

A suprema ironia de Deus é o seu plano de redenção. Escolhe pessoas sem mérito nenhum. Por essas dá o sangue de Cristo graciosamente como pagamento. Oferece como meio de alcançar a salvação uma fé que não se explica por nenhuma lógica e garante que não abre mão de nenhum dos pecadores que resgatou, mesmo sabendo que eles continuam a pecar.

Santa ironia. Graças a Deus.

quinta-feira, 10 de abril de 2008

Sois deuses ?


“Asseguro-vos que, se eles se calarem, as próprias pedras falarão” (Lc 19:40)

O homem , desde a criação, tem tentado se igualar a Deus , quando não quer ser mais importante do que Deus. Adão caiu em tentação porque acreditou que comendo do fruto da árvore do bem e do mal deixaria de depender do seu criador. A partir de Adão percebemos através de toda a história bíblica ou laica os esforços que o homem empreende para ser seu próprio deus.

O homem quer ser deus quando , filosoficamente , se coloca como senhor do universo – é nisso que se baseia o humanismo, o antropocentrismo da renascença e dos períodos clássicos até chegarmos no frenesi da auto-ajuda dos dias de hoje – supor que pode se “auto –ajudar “ leva o homem a condição de senhor do seu próprio destino ou, sendo mais popular : a ser senhor do seu próprio nariz.

O homem quer ser deus , na prática, quando procura refazer a criação – um sonho antigo que vem da ficção de Mary Shelley com a história do monstro do Dr. Frankenstein, passando pelo conceitos de eugenia (purificação de raças), até a clonagem de seres vivos que se pratica no dia de hoje (ou alguém é tão ingênuo a ponto de acreditar que ela se destina apenas a melhorar as raças de outros animais ?)

Mas ainda estão na religião – especificamente entre algumas categorias de religiosos – os principais exemplos de pretendentes a deus. Seja nas religiões místicas que defendem a tese de que cada homem é seu próprio deus , até o mais antigo dos ramos do cristianismo – o catolicismo.

Há tempos, o papa João Paulo II pronunciou a seguinte pérola : "A fé, embora seja um dom de Deus, não se desperta nem se mantém, sem a mediação dos evangelizadores". Ou seja, se não fosse através do trabalho dos homens (evangelizadores) Deus estaria perdido, pois a fé no mesmo não estaria sendo despertada nem mantida (sic).

A primeira parte da frase – a fé não se desperta – está dizendo que a obra do Espírito Santo é insuficiente sem a mediação humana. Acreditar nisso é se colocar acima da pessoa de Deus que executa em nós tanto o querer como o realizar . É o próprio Jesus Cristo que diz que se os homens não falarem , Deus usará o seu poder de tal forma que mesmo as pedras falarão. O trabalho de evangelização realizado pelos homens é importante mas, nunca mais importante que a ação de Deus.

A segunda parte – não se mantém – supõe que a fé é algo que pode ser perdido caso não seja alimentada por mãos humanas, quando sabemos que os eleitos não são somente redimidos por Cristo e renovados pelo Espírito Santo, eles também são guardados em fé por Deus.

Dentro do movimento que se diz evangélico, os exemplos também são inúmeros. Entre numa livraria evangélica qualquer e observe a quantidade de títulos de auto-ajuda cristã. Ouça programas de rádio e TV e preste atenção no discurso da auto-suficiência humana - em alguns momentos chega ao ponto de declarar que temos o direito de "exigirmos" de Deus os nossos direitos.

A fé , para muitos desses só se mantém enquanto seu líder do momento (e aí pode preencher com o título que cada um deles se atribui) estiver na crista da onda. Quando esses perdem seu poder (por escândalos ou para a concorrência) seus seguidores os abandonam.

Todos aqueles que estão espiritualmente unidos a Cristo através da regeneração, que é dada de graça pela vontade soberana de Deus, são eternamente seguros nEle. Nada pode separá-los do eterno e imutável amor de Deus.

Mas alguns ainda preferem confiar na capacidade de homens (ou de mulheres, sendo politicamente correto) a confiar em Deus. Não vou me surpreender no dia em que ouvir as pedras clamando.

domingo, 6 de abril de 2008

Louvor na Igreja


Formas e conteúdos

Ao entrar a arca do Senhor na Cidade de Davi, Mical, filha de Saul, estava olhando pela janela e, vendo ao rei Davi que ia saltando e dançando diante do Senhor, o desprezou no seu coração. II Samuel 6:16

Muita gente gosta de ficar discutindo sobre o que é ou não conveniente fazer em relação ao louvor na igreja. Membros reclamam de liberalidade ou conservadorismo. Pastores e conselhos inventam regras locais, outros concílios, em alguns casos legislam sobre o assunto e quem acompanha a postura dos candidatos aos diversos cargos do Supremo Concílio nota que todos estão preocupados com a questão da liturgia. Pode usar bateria ou será que só o órgão de tubos é sacro ?? Se pode, devemos limitar os ritmos usados ? Instrumentos elétricos ? Faz sentido usar gestos ? Ouvi dizer que tem igreja por aí que tolera até a dança .

É interessante notar que, enquanto a maioria das pessoas está preocupada com a forma do louvor, muito poucos são aqueles que têm se preocupado com o seu conteúdo. Costumamos olhar muito para os instrumentos e os ritmos e nos preocupamos pouco com aqueles que estão dirigindo o louvor e até que ponto aquilo que estão apresentando musicalmente é reflexo da sua comunhão com Deus e do seu sincero desejo de agradecer ao Senhor pelo que tem feito em suas vidas.

Quando Samuel é mandado à casa de Jessé para ungir Davi como o futuro rei de Israel, Deus já o advertia que o homem vê o exterior , porém Deus vê o coração ( I Sm 16:7). Mical , filha de rei e mulher de rei, conhecedora da história recente de Israel também se deixa levar pela aparência quando, ao olhar a festa de Davi, se escandaliza crendo que aquela forma de louvor atentava contra o decoro e a solenidade que deveriam ser mostradas diante de Deus.

Enquanto isso Deus atentava para o coração de Davi, sua alegria, seu agradecimento e o reconhecimento que a volta da Arca da Aliança acontecera pelas mãos de Deus. Davi reconhecia Deus como o Senhor soberano da história – e dançava por isso. O sinal da aprovação de Deus à dança e aos pulos de Davi ficam comprovados com a punição dada a Mical.

Aproveite e reflita no seu coração se você não tem olhado para o louvor na Igreja da mesma forma que Mical olhou Davi pela janela.

Isso significa que basta o louvor seja sincero , mesmo que mal feito, para que ele seja aceitável?

De boas intenções....

O número deles, juntamente com os seus irmãos instruídos no canto do Senhor, todos eles mestres, era de duzentos e oitenta e oito - I Crônicas 25:7


Minha mãe costumava repetir com freqüência que “de boas intenções o inferno está cheio”, no entanto muita gente dentro da igreja acredita que mesmo aquilo que é mal feito, se for feito apenas com boa vontade e sinceridade, já satisfaz a Deus. Não é o que a Bíblia nos diz.

A Bíblia nos diz que todos nós oramos mal e só somos ouvidos pela intercessão do Espírito Santo. Nos diz que todos devemos ler e reler a palavra de forma continuada e incessante. Mas a Bíblia também ensina que nem todos estão aptos para ensinar, que só alguns poucos tem o dom da profecia. E também diz que somente alguns são adequados para dirigir e executar o louvor dentro da igreja.

Além de estar em comunhão com Deus e serem exemplos de vida cristã , os músicos da igreja precisam estar tecnicamente preparados para isso. A igreja não é palco de programa de calouros nem rodinha de samba em mesa de botequim em que qualquer um canta e batuca. A solenidade do nosso culto não está vinculada aos instrumentos que usamos, mas à seriedade com a qual oferecemos a música a Deus. Quando Davi faz os preparativos para edificar o templo e determina os turnos e funções dos levitas ele não escolhe qualquer um para ser responsável pela música, nem aqueles que tinham somente boas intenções, mas aqueles que eram mestres nos seus instrumentos e no canto, ou seja, apenas os melhores. Nós não oferecemos sobras para Deus, mas aquilo que temos de melhor.

É claro que a igreja deve prover espaço e oportunidades para aqueles que estão aprendendo e começando mas, em momentos adequados para isso. Se vamos ter pianistas que sejam os que sabem realmente tocar o instrumento, se vamos ter bateristas que sejam os que se prepararam para executar o instrumento, se algum dia tivermos dança , que não sejam apenas os amadores de boa vontade. Qualquer músico , profissional ou não, sabe que a boa execução do seu instrumento exige tempo e dedicação, não apenas boas intenções.

Que nós possamos sempre lembrar disso e valorizar a música e os músicos da igreja. Na próxima semana vamos falar um pouco sobre a questão da música “mundana”, executada na igreja.

Endógenos e exógenos

...pois aqueles que nos levaram cativos nos pediam canções....dizendo: Entoai-nos algum dos cânticos de Sião - Salmo 137:3

O maestro Parcival Módolo em um dos seus artigos sobre música na igreja comenta que “no séc. XVII, no séc. XVIII e no início do séc. XIX, se alguém visitasse uma cidade européia e quisesse ver e ouvir o que de melhor aquela população produzia, iria para a Igreja.” A melhor música ( e o melhor da arte) estava na igreja. Claro que isso se devia ao fato que nos mil anos anteriores toda a cultura tinha ficado restrita à mesma, de qualquer forma, a igreja era a referência que o mundo leigo copiava. A isso se chama endogenia, ou seja, a música ia de dentro para fora da igreja.

Num determinado momento esse fluxo começou a ser revertido e, desde meados do séc. XIX a igreja passou a incorporar os valores estéticos não sacros, inclusive por que esses passaram a ser predominantes nas culturas ocidentais. Nosso hinário está repleto de canções populares que ganharam letras evangélicas ( inclusive o mais famoso hino evangélico “Vencendo vem Jesus” que é um hino militar da guerra civil americana). Outras músicas foram compostas com objetivos nada cristãos , como o “Largo” de Haendel e o hino “Grande é Jeová” de Wagner que são trechos de óperas. Hoje nós estamos desesperadamente correndo atrás da música secular, para imitá-la, para ver se a gente consegue manter as pessoas dentro da Igreja. Ao movimento que a música faz de fora para dentro da igreja chamamos de exogenia.

Não existe uma regra que determine que o louvor deva ser usado com esse ou aquele tipo de música, mas não deixa de ser importante notarmos na Bíblia que a música gerada pelo povo de Deus era admirada até pelos seus adversários e opressores quando esses pediam que os judeus voltassem a cantá-las mesmo no exílio. É significativo, mesmo na nossa história recente encontrar grandes músicos populares gravando os hinos clássicos evangélicos. É deprimente ver que nós não atraímos mais os babilônios e, pelo contrário, precisamos executar as suas músicas para não deixar os nosso judeus escaparem da igreja. Os babilônios de hoje “não estão nem aí” com a nossa música. Hoje há mais de 25 rádios “gospel” tocando música o dia inteiro. E daí, que diferença faz? Não tem diferença nenhuma das outras. Perdemos a função de sal da terra e luz do mundo.

Não seria bom se nós conseguíssemos voltar a ser pólos de atração e deixássemos de ser poeira metálica que qualquer imã atrai ? Afinal, o que o gosto musical de cada um tem a ver com o que tocamos na igreja ?

Quem precisa gostar do louvor ?

Digno é o Cordeiro que foi morto de receber o poder, e riqueza, e sabedoria, e força, e honra, e glória, e louvor....Àquele que está sentado no trono e ao Cordeiro, seja o louvor, e a honra, e a glória, e o domínio pelos séculos dos séculos. – Apocalipse 5 :11-13

Eu aposto que você leu o título desse artigo e pensou : “claro que é Deus”. Tenho certeza que ao acabar de ler o versículo se convenceu ainda mais disso. Se todos nós tivéssemos essas duas certezas permanentemente nos nossos corações esse artigo poderia acabar nesse exato momento e você poderia se ocupar somente em ler outras notícias do boletim.

Pena que isso não seja verdade. Não foi você que ouviu aquele hino agora há pouco e não participou junto com a congregação por que acha que essas músicas do hinário que usamos são muito “quadradas” ? Ou não terá sido você que ficou sentado durante os momentos que os jovens dirigiam o louvor pensando que aquilo não é coisa para ser tocada na igreja ? Talvez nesse exato momento você esteja inclusive lendo o boletim porque não gosta da música que estão tocando no prelúdio e resolveu gastar o seu tempo com o que você considera mais útil. Quantas vezes você não ouviu (ou falou ) que gosta ou não gosta de determinado estilo musical e, pior, se dependesse de você , esse tipo de música nunca seria executado na igreja.

O nosso maior erro quando resolvemos analisar a música na igreja é fazê-lo a partir do nosso gosto pessoal. Quando fazemos isso estamos criando um deus particular de cada um. Alguns desses deuses só gostam de música barroca. Outros acham que seu deus é fã de drum’n’bass. Uns querem um deus do séc. XV, outros entendem que seu deus é moderninho. E todos esquecem que o único e verdadeiro Deus é eterno e, para Ele, não existe presente, passado ou futuro. Que aquele que está sentado no trono tem o poder, o domínio, a honra e o louvor pelos séculos dos séculos e não apenas durante enquanto dura a última moda musical.

O pior de tudo é quando ouvimos pessoas dizendo que mudaram de uma igreja para outra por que determinado estilo de culto ou de prática musical combinava melhor com o seu jeito. Essas pessoas estão dentro de templos apenas para se auto adorarem e não para adorarem a Deus. Essas pessoas são aquelas que questionam a liturgia da igreja sem nenhuma base bíblica – mesmo porque, se lessem a Bíblia, descobririam que estão adorando o deus errado.

Quando você entra na igreja , qual é o deus que você veio adorar ? Se foi o seu deus particular eu recomendo que você volte para casa e vá ouvir as suas músicas preferidas. Mas se, pela graça de Deus, a sua escolha foi a do Cordeiro que foi morto seja bem vindo, adore conosco e participe alegremente de todos os momentos do culto.

quinta-feira, 3 de abril de 2008

Culto do bode expiatório

“Pessoas que sorriem quando acontece algo errado provavelmente já pensaram em quem vão jogar a culpa.” Martin de Haan

Quando os nossos primeiros pais foram confrontados por Deus em relação à sua desobediência eles tentaram evitar a resposabilidade pelo seus erros. Adão acusou Eva que, por sua vez, transferiu a culpa para a serpente que, no fim da cadeia da culpa, não tinha para quem passar a batata quente.

Esse tipo de atitude não acabou no Jardim do Éden. Milhares de anos depois os filhos de Israel culparam os pecados dos seus ancestrais pela punição que estavan recebendo. Eles diziam : “Os pais comeram uvas verdes e os dentes dos filhos é que embotaram” ( Ez 18:2) . Em outras palavras , eles usavam a transgressão dos pais como desculpa para os seus maus caminhos. Mas Deus declarou : “…a alma que pecar, essa morrerá”(Ez 18:4).

Atualmente a prática de jogar a culpa nos outros é ainda mais comum do que nunca. Um jornal uma vez trazia o seguinte texto : “Se existe uma doença comum nacional essa é a auto-piedade. Nós sentimos pena de nós mesmos e jogamos a culpa da nossa situação nos outros”.

Muita pessoas procuram em cantos escondidos da sua infância experiências que possam justificar que elas não são responsáveis pelo seu comportamento atual. O culto do bode expiatório cresce em todas as pessoas em todos os lugares. A culpa é dos pais pela educação (ou falta dela) que deram. Das circunstâncias sociais que levaram a pessoa aquela atitude. No limite, a velha desculpa de que a culpa é do sistema. Mas quem é mesmo que faz o sistema ?

De acordo com a Bíblia, quando tentamos jogar a responsabilidade da nossa culpa para outra pessoa entramos num beco sem saída, e pecamos de novo tentando atribuir falsamente o erro a outro. A questão não é descobrir quais os fatores que influenciarem o nosso erro, mas como eu aprender com eles para não cometê-los novamente. Como cristão não existe desculpa para o comportamento pecaminoso. É Deus que nos assegura que : “tudo posso naquele que me fortalece “ – especialmente, posso não pecar.

E mesmo sabendo que o pecado é inevitável, é a nossa natureza, não precisamos jogar a culpa em outra pessoa pois temos a certeza de que Cristo já levou sobre Ele as nossas faltas. De graça.



Gravura : O bode expiatório (1854) de William Holman Hunt