sexta-feira, 1 de outubro de 2021

Um révi na glória


No começo dos anos 70 o reverendo José Cássio Martins foi eleito pastor na Igreja Presbiteriana da Lapa, onde eu era membro e me gerou uma
 grande dúvida: se eu deveria chama-lo de reverendo (como o pastor anterior) ou se poderia chamá-lo simplesmente de Cássio, afinal de contas ele era casado com uma prima de meu pai e era assim que o chamávamos em família. Minha mãe contou para ele essa história, e o “Cássio” foi liberado.

Durante um pouco mais de 10 anos em que ele foi pastor da igreja eu descobri o que realmente era um pastor, na essência da palavra. Alguém que cuidava do rebanho com amor e carinho. Aliás, tirando ele, só conheci mais um que tinha esse espírito, os demais que me pastorearam podiam ser excelentes pregadores e gestores de igreja, mas não pastores.

Na igreja da Lapa se autodenominou “révi”, deixando a formalidade e a solenidade do termo reverendo, que não combinavam com sua personalidade.

Visitava continuamente os membros da igreja. Conhecia intimamente cada um deles. Antecipava problemas ao invés de tentar resolvê-los quando já tivessem explodido.

Além disso, foi um excelente seguidor do apóstolo Paulo, formando cuidadosamente seus “timóteos” e “titos”.

Ele era um pastor cuidadoso de cada membro, preocupado com a união da igreja, um excelente professor. Estava sempre mais preocupado com que o amor superasse os dogmas e que o consenso superasse o confronto.

Foi sob o seu pastorado que fiz minha profissão de fé, me tornei editor do jornal da mocidade e, depois, por dois anos presidente da união de mocidade.

Nunca me deixou na mão quando precisava dele. Fosse para me fornecer material para estudar, fosse na gestão da mocidade e da minha vida pessoal.

No final do seu segundo mandato afloraram algumas dissensões na igreja. Ele poderia muito bem ter sido reeleito, mas preferiu não se candidatar. Não tinha o espírito de ser a autoridade imposta pela maioria, ou era pastor de todos ou não.

Claro que, como pastor e como primo, continuou presente na minha vida. Junto com o tio Américo (que era seu sogro) celebrou meu casamento, continuou sendo presença regular em casa e um amigo para tirar dúvidas das mais diversas, inclusive considerando que além de pastor era psicólogo.

Dentro do possível continuamos conversando, nem que fosse uma vez por ano no seu aniversário, o papo nunca se limitava às congratulações de praxe.

Hoje o révi foi para a glória, ao encontro do Pai que, certamente o está recebendo com os braços abertos e dizendo: servo bom e fiel, foste fiel no pouco sobre o muito te colocarei.

Enquanto não nos encontrarmos além do rio, ficam as saudades.