Iniciamos a parte final do estudo da Providência, que é a respeito do mal. Desde a Teodicéia, que é a forma como as pessoas tentam justificar Deus (como se Deus precisasse ser justificado), mas como existindo Deus o mal existe. Essa é a grande discussão da Teodicéia. E toda a questão do mal, mal moral, mal físico. Antes de entrarmos nesta parte final que, na minha opinião, é a mais complicada de todos, vamos ver como as religiões vêem esta questão da Providência. Trataremos das religiões não em denominações, mas em grandes grupos a partir da Cosmogonia que elas têm. Cosmogonia é a maneira como vemos o Universo. Para muitas religiões a Providência de Deus é inexistente, que tem a ver com a lógica da maneira como elas encaram Deus, o mundo, o universo e tudo mais.
A primeira grande divisão é dos Não Cristãos e Cristãos. O primeiro grupo dos Não Cristãos é o Ateísmo, os que se dizem ateus. Sabemos que 95% deles, na verdade, não são ateus, são só contra o Deus dos cristãos. Declaram-se ateus porque acham que Deus é injusto, vingativo, mas não que sejam realmente ateus. Ateu é aquele que não crê na existência de qualquer deus, que tem a firme convicção de que não há Deus. A + Theo; “a” partícula negativa mais Deus (Theo). Ateu é o que nega a existência de Deus. Como o ateu vê o universo e seu funcionamento sem a existência de Deus? Para ele o universo surgiu do acaso e sempre existiu, funcionando de forma automática e natural. Se Deus não existe e o universo funciona automaticamente, como surge o mal? É uma pergunta sem resposta da parte do ateu. Ele diz que se Deus existisse não existiria o mal. Como não sabe explicar a origem do universo, não sabe a origem do bem e do mal, ficando grandes falhas teóricas ou lógicas em seus argumentos. Como Deus implantou em nós, em nossa natureza a semente da religião, o ateu nega algo que está dentro de nós. Se não há Deus, o universo surgiu do acaso e funciona por conta própria, não existe Providência.
Há um outro grande grupo de religiões, o Deísmo. Não confundir com Teísmo. Nós somos teístas. O deísta é aquele que acredita em um Deus apenas transcendente. Isto é, acredita na possibilidade de haver um Deus, que criou todas as coisas e voltou para o Seu lugar, deixando tudo por conta própria. Entre os deístas estão os agnósticos. Agnóstico é aquele que nega a possibilidade de se conhecer a Deus. Ele não diz que Deus não existe, mas que é impossível conhecê-Lo. O deísta diz que Deus criou o universo com suas regras, como uma máquina automática, a colocou para funcionar e ela funciona dentro dessas regras exatas. Não é a favor do destino, porque destino pressupõe que alguma coisa está prevista para acontecer. O conceito é que Deus colocou regras gerais para funcionar, regras naturais para o funcionamento do ser humano, mas não que Ele predeterminou alguma coisa para frente. O que acontece se estivermos dentro de uma lógica deísta? Se Deus não tem mais nada a ver com o que está acontecendo no dia-a-dia, então nós resolvemos todas as nossas coisas. O deísta acredita em Deus, mas não crê que Ele continua interferindo. Se Deus criou todas as coisas e as leis que as regem, perfeitas ou não, como funciona a questão do mal, como que surge o mal? Para confessar que Deus está refugiado em Seu castelo e não sai de lá, portanto também não existe Providência.
Há também um outro grupo que é o oposto dos teístas, que são os Panteístas. Pan significa tudo. Quando se fala em jogos Pan-americanos, é porque junta todos os países da América. Os panteístas do Extremo Oriente criaram um movimento chamado Nova Era. O dirigente da cerimônia gasta meia hora invocando deuses, que lembra Paulo em Atenas. No final dos anos 80 o movimento foi muito forte; e aí temos o povo fazendo anjo, velas, ervas, etc, etc. O panteísta é o contrário do deísta porque acredita que Deus é só imanente, ou seja, que Deus está em todos e em tudo; em todas as coisas; o Criador se confunde com a criação, porque Ele mesmo é parte integrante da obra criada. Deus está na plantinha, na cadeira, no bichinho, está em você, não como nós cremos que Deus veio habitar em nós, mas que Deus faz parte de você, do seu conteúdo, ou seja, você é uma parte de Deus ou Deus é uma parte de você. Não explicam a origem do mal, porque se Deus está em todas as coisas, não pode haver o mal. Quando acontece uma coisa realmente feia, não tem explicação. Como Deus pode estar dentro de um bandido? Se Deus está em todas as coisas, também está dentro do mal. O filósofo Spinoza disse que a existência do mal faz parte da perfeição do mundo; afirmando que se o mal não existisse o mundo seria um tédio. Para o mundo ser perfeito precisa haver esse conflito metafísico que gera o pensamento, portanto a existência do mal faz parte da perfeição do mundo. Assim o mal faz parte de Deus, desse deus que está em todas as coisas. A maioria das religiões hinduístas diz que o mal é uma ilusão, que o mal não existe. O mal não passa de uma visão errada do que está acontecendo. Se Deus está em todas as coisas o tempo todo, também não existe Providência. Não existe diferença entre criador e criatura; se não existe essa diferença então não precisa haver alguém cuidando de algo, porque esse deus está acontecendo junto com todas as coisas o tempo todo. Se está presente em todas as coisas ele faz parte dos acontecimentos, não é alguém zeloso cuidando de alguma coisa. Não há conceito de Providência. Existe o grupo dentro dos panteístas que acredita que o mal existe e que, se Deus está em todas as coisas, Ele faz parte dessa existência.
Dualismo. O dualista é aquele que acredita que existem dois poderes: o bem e o mal, e que estes poderes são independentes. Nós também acreditamos no bem e no mal e que o mal tem poder. Porém o dualismo entende que esses poderes são igualmente independentes, que vêm de Deus e do diabo, mas o diabo não está sob o controle de Deus. São independentes e combatem um contra o outro, até o momento em que vai haver um vencedor; que não está definido para o dualista, mas que o bem vai vencer, não como nós que cremos que o mal já está vencido. Eles acham que o diabo age e de maneira independente; o que significa que Deus não é soberano. Existe cristão dualista, é aquele que não tem uma fé convicta em alguma coisa. Não podemos confundir sincretismo com panteísmo; sincretismo é a mistura de duas ou mais crenças. Qual é a grande lógica do dualismo? Tem alguma coisa que facilita a vida do dualista, é o fato de que Deus não é responsável pelo mal. Isso facilita a vida do dualista porque não é preciso entrar nessa discussão. Se Deus está no controle de todas as coisas e é a causa primeira de todas as coisas, como é que fica o mal? Quando acontece o mal, tentam justificar Deus afirmando que Deus não tem nada com isso, pois Deus é só o bem. Deus é só amor, só bondade, só graça e misericórdia. O mal é outro poder. Se alguém pratica o mal, é como em desenho animado: um anjinho falando numa orelha e o diabinho do outro lado falando na outra orelha. É muito difícil de acreditar que o mal moral que acontece no mundo, o mal físico que acontece às pessoas, está sob o controle de Deus. O grande nó é aceitar a Soberania de Deus. Quando aceitamos a soberania fica tão fácil de entender. Quando não aceita a soberania divina, é preciso achar caminhos para explicar certas coisas. O mal não é praticado por Deus, mas o mal não existiria se Deus não tivesse criado os seres que iriam praticá-lo. Para o dualismo não existe Providência, porque Deus está só do lado bom.
Nós, cristãos reformados, agostinianos, acreditamos na soberania absoluta de Deus sobre todas as coisas em todos os momentos. Mas entre os CRISTÃOS temos um grupo que chamamos de Liberdade e outro chamamos de Semi-Liberdade, que nada tem a ver com a pessoa ser liberal ou não liberal, mas com a Teologia; aí surge no Século II o teólogo cristão Pelágio que teve como principal opositor teológico, Agostinho. A premissa de Pelágio é que o homem é totalmente livre para tomar as suas decisões. O grupo Liberdade é definitivamente o defensor do homem com livre arbítrio sem limites. O homem decide todas as suas coisas, inclusive sua relação com Deus. Pelágio achava que é possível o homem não pecar. O pecado é contingência, acontece na vida das pessoas, mas que não fazia parte da natureza, era algo adquirido, ou seja, ele peca em convívio com outros pecadores; mas se ele quiser, como tem total liberdade, ele pode optar por não aceitar. Ele teria a capacidade de não pecar. Ele não acreditava na hereditariedade do pecado. Ele aceitava o pecado original, mas não que passa de pai para filho, não aceitava a herança do pecado. Ele dizia que a pessoa pode não aceitar pecar porque nasce como Adão antes de pecar. Ele achava que precisava da graça de Deus, mas o homem que toma a decisão de crer em Deus. O homem é total e absolutamente livre para aceitar ou não, para decidir pela minha salvação ou não. Nesta lógica Deus não é Soberano; não é Onisciente, porque Deus não sabe o que vou decidir, pois sou totalmente livre para decidir; Deus não é Onipotente, porque se eu decidir por uma coisa diferente, eu vou fazer. Deus queira ou não. A doutrina pelagiana diz que o homem tem livre arbítrio para tomar decisões; se ele resolver se arrepender não negam que Cristo morreu pelos pecados, mas querer ser purificado dos pecados é uma decisão pessoal. Se decidir se arrepender, aí, sim, Deus fez essas coisas para me limpar do pecado. Deus só age depois que o homem decide alguma coisa, Deus é reativo. O que significa que não há Providência. Podemos dizer que está quase igual o dualismo, a diferença é que no dualismo o poder está no bem e no mal, e para o pelagiano está entre Deus e o homem.
Depois disto surgiram os semi-pelagianos, depois vieram os contestadores desses, depois vieram outros até chegar Lutero; então veio Arminio dizendo que Pelágio errou em muitas coisas, mas havia alguma coisa certa; o homem continua tendo livre arbítrio, não tão amplo, geral e irrestrito como diz Pelágio. Armínio nunca nega que o homem é pecador, que nasce em pecado, não é tão radical, mas diz que Deus tem propósitos gerais e não específicos, ou seja, Deus tem grandes planos, mas não para a vida humana individual. Portanto, o homem continua tendo decisões livres; não é totalmente livre porque tem certas limitações, ou seja, é quase livre, é chamado de Semi-Liberdade. Deus é Onisciente porque Ele sabe tudo o que está passando por aqui, mas não é Onipotente porque o homem pode ouvir o chamado da salvação e recusar. Para eles o homem tem livre arbítrio para tomar suas decisões espirituais. Amanhã pode mudar de idéia e dizer que não quer mais ser salvo. O metodista e o batista tradicional são arminianos.
A Providência de Deus é definitivamente uma doutrina do grupo de religiões que são Teístas, que Deus é, ao mesmo tempo, Imanente e Transcendente, que Ele participa de tudo e que está no controle de tudo.
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