De um lado, temos aquele que está dentro de uma religião e se preocupa em tentar entender a história do mal moral, ou, pelo menos, tenta deixar Deus fora dessa história do mal moral; do outro lado aquele que não crê em Deus, acreditando muito mais no mal físico do que no mal moral. A discussão é: se Deus existe porque pessoas sofrem, porque determinadas coisas acontecem, o porque do sofrimento, da guerra, dos crimes. Se Deus é tão onipotente por que Ele deixa acontecer essas coisas?
Gênesis 1.31 – Viu Deus tudo quanto fizera, e eis que era muito bom. Houve tarde e manhã, o sexto dia.
Tudo o que Deus criou é bom, é muito bom. Num determinado momento entra o mal moral, e uma das conseqüências do mal moral é a entrada do mal físico, e fica uma questão que é um pouco recorrente, porque, nem sempre, quem sofre é quem pecou. Há uma tendência de pensar que há uma relação direta entre pecado e castigo. Há na Bíblia pessoas que são vítimas do pecado de outros. Nem sempre aquele sofrimento específico tem a ver com o mal moral. Quando acontecem as grandes tragédias atribuem ao castigo de Deus, dizendo que eram hereges, ou idólatras.
Mal Físico na Natureza
Gênesis 3.18-19 – Ela (a terra) produzirá também cardos e abrolhos, e tu comerás a erva do campo. No suor do rosto comerás o teu pão, até que tornes à terra, pois dela foste formado; porque tu és pó e ao pó tornarás.
Adão e Eva desobedecem a Deus e são castigados com uma vida dura, de muitas lutas. Castigo que veio por causa do pecado de Adão e Eva e esse pecado contamina toda a terra, toda a criação, porque é mais do que dizer que a partir de agora todos os homens estão condenados, mas criação toda. No texto vemos que há coisas que não existiam no Jardim do Éden: cardos e abrolhos. A própria natureza passa a ter componentes que são venenosos, agressivos. Toda a natureza passa a sofrer as conseqüências do pecado do homem.
Romanos 8.22 – Porque sabemos que toda a criação, a um só tempo, geme e suporta angústias até agora.
Não está dizendo que todos os homens, mas, por causa do pecado, toda a criação sofre angústia, sofre dor, sofre mal físico. É um mal tão forte que se espalha por tudo. Se só o homem fosse castigado, ele estaria sofrendo no meio da perfeição, porque a natureza continuaria perfeita, como foi criada.
Mal Físico no Ser Humano
Atos 3.2 – Era levado um homem, coxo de nascença, o qual punham diariamente à porta do templo chamada Formosa, para pedir esmola aos que entravam.
A pergunta daquele tempo era que pecado ele cometeu para ter esse problema? Foi a pergunta dos discípulos para Jesus a respeito do cego de nascença (João 9.2-3).
2ª Pedro 3.7 e 10 – Ora, os céus que agora existem e a terra, pela mesma palavra, têm sido entesourados para fogo, estando reservados para o Dia do Juízo e destruição dos homens ímpios. Virá, entretanto, como ladrão, o Dia do Senhor, no qual os céus passarão com estrepitoso estrondo, e os elementos se desfarão abrasados; também a terra e as obras que nela existem serão atingidas.
Não sobrará nada que conhecemos como Universo. Então, a origem do mal físico é o pecado, desde o pecado de Adão. Tudo é contaminado por isso. O mal físico existe por causa do pecado. Sofremos por causa do pecado, nascemos pecadores. O pecado contaminou a terra. Não significa que cada dor que sentimos seja resposta imediata do pecado cometido há cinco minutos, mas tudo o que sofremos é por causa do nosso pecado.
Pecado e Castigo
Precisamos separar o pecado como uma natureza nossa, ou seja, nascemos naturalmente em pecado, da relação causa e efeito imediato: pecou foi castigado. Se sofremos é por causa da nossa natureza pecaminosa. A Bíblia registra alguns casos de castigo imediato; e Deus continua respondendo imediatamente. Dos casos que a Bíblia fala, temos certeza, porque Deus diz claramente a causa do castigo; o que acontece hoje, não sabemos. Independente de termos sido castigados ou não por um pecado recente, de qualquer forma estamos sendo castigados pelo pecado essencial que temos, porque se não existisse o pecado nós não estaríamos sujeitos ao sofrimento. Toda a criação passa a ser afetada pelo pecado humano. É por essa causa que os animais sofrem dores, fome, enfermidades, morte, junto com toda a criação. Quando da queda do homem, Deus disse: maldita é a terra por tua causa (Gênesis 3.17). Deus amaldiçoou toda a terra por causa do pecado de Adão e Eva. O pecado deu origem ao mal físico e toda a criação está sob o mal físico.
Isaías 11.6-9 – O lobo habitará com o cordeiro, e o leopardo se deitará junto ao cabrito; o bezerro, o leão novo e o animal cevado andarão juntos, e um pequenino os guiará. A vaca e a ursa pastarão juntas, e as suas crias juntas se deitarão; o leão comerá palha como o boi. A criança de peito brincará sobre a toca da áspide, e o já desmamado meterá a mão na cova do basilisco. Não se fará mal nem dano algum em todo o meu santo monte, porque a terra se encherá do conhecimento do Senhor, como as águas cobrem o mar.
Imagine o Éden que se perdeu e que será restaurado depois de passar toda essa criação contaminada.
Mal Físico Coletivo
Temos falado do mal físico que atinge os homens; há mal físico coletivo. Assim como o sol brilha para todos, há sofrimento que atinge a todos, sobre bons e maus. Se entendermos, em especial, os males coletivos, poderemos dissociar esta relação pecou foi punido. Quando vemos o mal individual, temos essa tendência de associar “pecou foi punido”. O mal coletivo quando se abate sobre todos, sabemos que a origem é o pecado, mas não obrigatoriamente o pecado imediato e pessoal.
Ezequiel 6.11 – Assim diz o Senhor Deus: Bate as palmas, bate com o pé e dize: Ah! Por todas as terríveis abominações da casa de Israel! Pois cairão à espada, e de fome, e de peste.
Deus diz assim: O povo cometeu uma série de abominações e serão castigados com a guerra, a fome e a peste. Todos em Israel tinha se comportado assim? Não. Mas todos foram castigados. Quando foram para o exílio, todos foram, Deus não poupou os que permaneciam fiéis. O castigo era para todos.
Joel 2.25 – Restituir-vos-ei os anos que foram consumidos pelo gafanhoto migrador, pelo destruidor e pelo cortador; o meu grande exército que enviei contra vós outros.
Deus está dizendo “vou restituir”, mas, esse tempo todo, todos foram castigados. Houve situações que Deus poupou alguém muito especificamente. Então, um sofrimento coletivo é a pobreza; pobreza que revolta muito as pessoas, pobreza que sustenta algumas pessoas, porque, em todas as situações há gente que se beneficia. Como é que está todo mundo sofrendo e um, lá no meio, não? Somos um pouco arrogantes e achamos que podemos resolver todo o problema do mundo; que vamos criar o céu na terra, nessa vida. Mas também não temos de tolerar a pobreza; temos a nossa missão de trabalhar contra isso, temos de ter consciência de que ela sempre vai existir, e que estamos servindo ao Senhor.
Mal Físico Coletivo: A Pobreza
A pobreza pode ser tanto um mal físico coletivo como individual. Há situações em que a pobreza se espalha por todo o povo, como a que a guerra traz; e há situações em que ela é individual. A origem da pobreza é o pecado, mas vemos na Bíblia que há várias situações de pobreza sobre as quais não temos controle:
1) Pobreza por causa de infortúnio: calamidades, doenças, pestes.
Provérbios 10.15 – Os bens do rico são a sua cidade forte; a pobreza dos pobres é a sua ruína.
Situação sobre a qual eles não têm controle.
Tiago 1.27 – A religião pura e sem mácula, para com o nosso Deus e Pai, é esta: visitar os órfãos e as viúvas nas suas tribulações e a si mesmo guardar-se incontaminado do mundo.
Tem pobreza que faz parte da natureza do pobre, segundo Provérbios, e Tiago está dizendo que não é por isso que vamos abandonar, mas temos de cuidar deles. Não é porque a Terra vai se acabar, nem porque os pobres vão sempre existir que deixaremos de cumprir com a nossa missão, nossa obrigação. Depois de ficarem viúvas Noemi e Rute voltaram para Israel porque precisavam ser amparadas.
Deuteronômio 15.9 – Guarda-te não haja pensamento vil no teu coração, nem digas: Está próximo o sétimo ano, o ano da remissão, de sorte que os teus olhos sejam malignos para com teu irmão pobre, e não lhe dês nada, e ele clame contra ti ao Senhor, e haja em ti pecado.
Qual seria o pecado? Esperar pelo ano da remissão quando não haveria mais pobreza.
Deuteronômio 24.19-22 – Quando, no teu campo, segares a messe e, nele, esqueceres um feixe de espigas, não voltarás a tomá-lo; para o estrangeiro, para o órfão e para a viúva será; para que o Senhor, teu Deus, te abençoe em toda obra das tuas mãos. Quando sacudires a tua oliveira, não voltarás a colher o fruto dos ramos; para o estrangeiro, para o órfão e para a viúva será. Quando vindimares a tua vinha, não tornarás a rebuscá-la; para o estrangeiro, para o órfão e para a viúva será o restante. Lembrar-te-ás de que foste escravo na terra do Egito; pelo que te ordeno que faças isso.
Foi baseado neste texto que Boaz deu ordem aos seus servos para deixarem cair mais do que cairia normalmente, para que Rute recolhesse (Rute 2.15-16). Veja que a lei de Deus não era somente para socorrer os necessitados de Israel, mas também o estrangeiro.
Provérbios 17.5 – O que escarnece do pobre insulta ao que o criou; o que se alegra da calamidade não ficará impune.
A questão é: os pobres são pessoas, e pessoas que precisam de ajuda. Escarnecer não é só fazer piadas de mau gosto, mas também quando não estamos considerando como pessoas, criaturas de Deus.
2) Pobreza por causa da opressão: Há pobreza por causas gerais e também há pobreza do homem causada pelo próprio homem, no caso de governantes opressores, déspotas.
Provérbios 3.23 – A terra virgem dos pobres dá mantimento em abundância, mas a falta de justiça o dissipa.
A terra dá mantimento com fartura, mas a injustiça provoca a pobreza.
Isaías 5.8 – Ai dos que ajuntam casa a casa, reúnem campo a campo, até que não haja mais lugar, e ficam como únicos moradores no meio da terra!
Vão acumulando, acumulando, acumulando, para ter e não por necessidade. O que acontecia em Israel, tão diferente do que acontece em toda a nossa história agrária! Quem tinha terra distribuía para todo mundo; alguns, por algum motivo perdiam tudo, e os que tinham emprestavam dinheiro e ficavam com a terra.
Eclesiastes 5.1-2 – Guarda o pé, quando entrares na Casa de Deus; chegar-se para ouvir é melhor do que oferecer sacrifícios de tolos, pois não sabem que fazem mal. Não te precipites com a tua boca, nem o teu coração se apresse a pronunciar palavra alguma diante de Deus; porque Deus está nos céus, e tu, n terra; portanto, sejam poucas as tuas palavras.
Eclesiastes 4.1-3 – Vi ainda todas as opressões que se fazem debaixo do sol: vi as lágrimas dos que foram oprimidos, sem que ninguém os consolasse; vi a violência na mão dos opressores, sem que ninguém consolasse os oprimidos. Pelo que tenho por mais felizes os que já morreram, mais do que os que ainda vivem; porem mais que uns e outros tenho por feliz aquele que ainda não nasceu e não viu as más obras que se fazem debaixo do sol.
Há pergunta é: Quando alguém entra na Casa de Deus para a adoração, será que lá fora alguém não está sendo oprimido por ele? Oprimir o pobre é escarnecer dele; e isso insulta a Deus.
Provérbios 29.7 – Informa-se o justo da causa dos pobres, mas o perverso de nada disso quer saber.
Provérbios 31.8-9 – Abre a boca a favor do mudo, pelo direito de todos os que se acham desamparados. Abre a boca, julga retamente e faze justiça aos pobres e aos necessitados.
O justo se preocupa com a causa daquele que nada tem. Quando Salomão cita o mudo, está falando, de um modo geral, daqueles que não têm como se defender e tem direito a ter voz. A pobreza não é só por culpa do sistema, existem também as culpas individuais.
3) Pobreza por causa da preguiça:
Provérbios 13.4 – O preguiçoso deseja e nada tem, mas a alma dos diligentes se farta.
Provérbios 14.23 – Em todo trabalho há proveito; meras palavras, porém, levam à penúria.
Provérbios 12.27 – O preguiçoso não assará a sua caça, mas o bem precioso do homem é ser ele diligente.
Vemos que Provérbios tem uma coleção de versículos a respeito da preguiça. Não podemos nem cair na tentação de dizer que toda pobreza é exógena, ou seja, vem de fora, pela opressão de outros, pelo infortúnio, mas também não podemos alegar que toda pobreza é preguiça. Não podemos cair em extremos, pois existem pobrezas de origens diferentes.
4) Pobreza por causa da ignorância espiritual:
Provérbios 13.18 – Pobreza e afronta sobrevêm ao que rejeita a instrução, mas o que guarda a repreensão será honrado.
Existe pobreza que é provocada pela ignorância espiritual; não aceita a instrução de Deus e pode ser castigado por isso. Pode não ser infortúnio, pode não ser opressão, pode não ser por preguiça.
5) Pobreza por causa da imprudência:
Lucas 15.11-16 – Continuou: Certo homem tinha dois filhos; o mais moço deles disse ao pai: Pai, dá-me a parte dos bens que me cabe. E ele lhes repartiu os haveres. Passados não muitos dias, o filho mais moço, ajuntando tudo o que era seu, partiu para uma terra distante e lá dissipou todos os seus bens, vivendo dissolutamente. Depois de ter consumido tudo, sobreveio àquele país uma grande fome, e ele começou a passar necessidade. Então, ele foi e se agregou a um dos cidadãos daquela terra, e este o mandou para os seus campos a guardar porcos. Ali, desejava ele fartar-se das alfarrobas que os porcos comiam; mas ninguém lhe dava nada.
Porque o filho foi à pobreza? A pobreza pode ser causada pela imprudência; por não ser um bom mordomo daquilo que Deus dá. Estamos pegando um caso extremo de alguém que foi atrás de prazer da carne, prazeres terrenos, e gastou tudo. Há outros tipos também de imprudência. Um dos discursos da Teologia da Prosperidade é esse: “sou herdeiro de Deus e quero a minha parte agora, em dinheiro”. As igrejas que mais cresceram nesta última década são as da Teologia da Prosperidade.
6) Pobreza por causa de vícios sociais:
Há a pobreza provocada pelos vícios sociais, que podem ser diversos, coletivos, individuais. Há aí um círculo vicioso: o vício provoca a pobreza, a pobreza provoca o vício. O pai preso que deixa a família na miséria. Esta família que está na miséria não é culpada porque o pai erra e a pobreza quem sofre é a família. A pobreza é em decorrência do pecado de outro. A pobreza, que é um dos males físicos, tem muitas origens; temos de lidar com ela, não tentando achar o culpado, mas pensando que, enquanto estamos aqui, nossa relação com a pobreza é estender a mão. Há outros casos de miséria, além desse pai preso que larga a família, temos o bêbado, o drogado e, em nossos dias, o empresário falido que deixa o empregado na miséria. Não podemos por a pobreza em primeiro lugar, como fez Judas Iscariotes quando Maria ungia Jesus com bálsamo de nardo puro (João 12.4-6), mas não se pode ignorá-la. Sabemos que a pobreza é conseqüência do pecado de todos nós.
Além da pobreza, há a guerra, a doença, a fome e, por fim, a morte. A morte física é a conseqüência de tudo isso, ou seja, a morte pode vir da pobreza, da doença, da guerra, mas ela veio. A morte, apesar dela ser incômoda para muitos, ela é uma obra da providência divina. A morte espiritual também é obra da providência de Deus; mas estamos falando da morte física, porque estamos tratando dos males físicos. A morte física é conseqüência do nosso pecado, todos pecamos. Morremos integralmente, nós recebemos a promessa da morte física e também da morte espiritual. A diferença é que quando nós aceitamos a Cristo, nos convertemos, recebemos uma nova vida, porque aquela outra nós perdemos, pois nascemos de novo, recebendo uma nova vida espiritual, e no futuro receberemos um novo corpo físico. Não sabemos como será, porém temos certeza de que será, receberemos um novo corpo e um novo nome.
Aula ministrada na Igreja Presbiteriana Unida de São Paulo
Transcrição da Missionária Heloísa Martoni
Bibliografia usada na preparação da aula:
A providência – Rev Héber Carlos de Campos
As Institutas – João Calvino
Razão da Esperança – Rev Leandro Antonio de Lima
Teologia Sistemática – Louis Berkhof(todos da Cultura Cristã/CEP)
As citações Bíblicas são da tradução de Almeida - revista e atualizada - Sociedade Bíblica do Brasil
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